«Não é apenas uma outra imagem da nação, é uma outra imagem do homem que o fascismo propõe. Entre as qualidades do homem há as que o espírito fascista coloca acima de todas as outras, porque lhe parecem as qualidades sobre as quais repousam a força e a durabilidade dos Estados e também são aquelas que permitem ao homem dar um sentido à sua vida. Essas qualidades são aquelas que em todos os tempos foram exigidas aos homens que participaram em missões difíceis ou perigosas; a coragem, a disciplina, o espírito de sacrifício, a energia, virtudes que se exigem dos soldados no combate, dos pioneiros, das tripulações em perigo. São qualidades propriamente militares e, por assim dizer, animais: elas recordam-nos que a primeira tarefa do homem é proteger e conquistar, vocação que a vida gregária e pacífica das cidades nos faz esquecer, mas que o perigo faz despertar bem como toda a obra difícil onde o homem reencontra os seus adversários naturais: as tempestades, as catástrofes, os desertos. Estas qualidades animais do homem engendraram outras que lhes são inseparáveis, porque fazem parte do código de honra que se estabeleceu no perigo: são a lealdade, a fidelidade, a solidariedade, o desapego aos interesses. Sobre estas qualidades estabeleceram-se desde todos os tempos as relações dos homens entre si nas mesmas horas de incerteza e abandono. Elas constituem um sistema de compromissos mútuos sobre os quais todos os grupos de homens podem viver: o resto da moral não é mais do que uma série de aplicações, que variou e variará sempre em função dos tempos e dos lugares. Mas estas mesmas qualidades que são, digamos assim, funcionais, e que o sonho fascista toma por essenciais, desenvolvem outras, por sua vez, que não são mais que o refinamento dessas qualidades primordiais e que se tornam essenciais à medida que o animal humano se torna mais consciente daquilo que é e daquilo que quer. Essas qualidades são um luxo a que as sociedades militares se deram desde que elas tomaram a sua forma e constituíram a sua hierarquia. Abrangem o orgulho, a exactidão da palavra dada, a generosidade, o respeito pelo adversário corajoso, a protecção dos que são fracos e desarmados, o desprezo por aqueles que mentem e, ao contrário, a estima pelos que se opõem lealmente. Estas qualidades cívicas, que sentimos ainda palpitar obscuramente nas nossas cidades decadentes, constituíram a honra daqueles que, no passado, fizeram profissão de se bater e de ser plenamente homens. Reencontramo-las tanto nas ordens militares e religiosas como entre os príncipes sarracenos e os samurais. Elas constituem, no fundo, o único código que as sociedades militares reconheceram como sendo conforme à sua vocação, são o essencial da honra do soldado.»
Maurice Bardèche, Qu’est-ce que le fascisme?